Professor só tem dois destinos possíveis: enquanto está aqui
na Terra é a cadeia. Depois que bater com as dez é o inferno. Simples assim.
Entre os adjetivos que podemos e devemos usar para qualificar um professor estão:
ladrão, contrabandista, falsário, gatuno, larápio, safado. Em resumo, professor
é tudo bandido. E ponto final.
Eu arriscaria estender essa minha definição a todo e
qualquer professor, mas, como eu mesma sou professora, portanto, carrego comigo
todos os adjetivos citados acima e não quero aumentar minhas penas com
acusações de injúria, calúnia, difamação, danos morais e blá, blá, blá, vou
restringir meus comentários aos professores de língua estrangeira.
(Mas lá no fundo o que vou dizer serve pra TODOS os mestres
que se esgueiram criminosamente pelo mundo, tenho certeza!)
Retomando, professor de língua estrangeira é tudo bandido. A
gente faz fotocópia não autorizada de livro, jornal, revista; baixamos clipes
de música da internet; copiamos discos e filmes de todo gênero; usamos imagens
de Deus e o mundo sem pedir licença; mandamos vir ou trazemos, nós mesmos, DVDs
de outros países dos quais vamos quebrar o mecanismo de regiões que impedem que
os filmes sejam exibidos aqui, ou desbloquearemos o aparelho de DVD!
Não há um só dia, uma só aula, em que eu não infrinja alguma
lei de direito autoral e, ouso arriscar, imagino que o mesmo acontece com meus
colegas de profissão, seja em que sala dessa Torre de Babel repleta de
meliantes eles estiverem.
O mais engraçado é que não lucramos com o fruto de nossas
más ações, ao contrário, pagamos por
ele, literalmente, isto é, usamos o nosso vil metal! Pagamos as cópias,
compramos os DVDs virgens ou não, gastamos nosso tempo, dinheiro, além de horas
e horas da banda larga da nossa internet (sem falar nas horas de sono que
prodigalizamos nessas tarefas).
Assim foi, assim é e assim será cada vez mais.
Se a polícia decidisse botar escuta num centro de línguas
qualquer poderia ouvir coisas como:
- Aí brother, tô
com uma lista novinha de filmes pra trabalhar os tempos do passado. Vai um aí?
- Opa, mec,
demorô! Passa o bagulho pra cá! Madona
mia! Grazie!
- Hombre, como tu
é um profe manero, vou liberá isso aqui pra ti também. Tiens!
- Ach ja. Mas é
aquela música que a gente usa pra trabalhar negação! Do cholery! Eu tava atrás disso há um tempão. Como é que tu
conseguiu?
- Easy! Fiz uma
conta com endereço no estrangeiro e comprei um vale presente pra mim mesmo, daí
consegui usar o vale presente pra baixar o MP3 da música e também uns e-books
de autores contemporâneos.
- Trop cool, aê!
- Pra semana que vem vou dar um jeito de baixar uns
documentários daquele canal de TV com restrição de visualização em outro país e
te aviso.
- Ça marche, cabron!
E os policiais nem vão precisar de intérprete. Mas, se
precisarem, vão ter vários à disposição no xilindró porque o resultado dessa
blitz vai ser superpopulação de professor em cana.
O que eu acho mesmo é que devia aparecer alguém com coragem
suficiente pra fazer uma espécie de “quebra de patente” do mesmo jeito que
fizeram com os medicamentos uma vez: simplesmente acabar com essa história de
direito autoral pra uso educacional de bens culturais. Livro, foto, revista,
filme, comercial, música, clipe, DVD, etc., etc., etc. Se é pra usar em sala de
aula, pra educação, então não tem essa de direito autoral. Usa-se e pronto. No
todo, em parte, cortado, editado, de qualquer jeito.
Tem trabalhos maravilhosos que poderiam ser feitos em sala
de aula e que não são porque há restrição de uso, ou ficaria tão caro pagar
esses direitos que a atividade é inviável. Quer dizer, muitos não são feitos,
mas outros acontecem simplesmente porque os professores ignoram solenemente a
lei, os perigos, as sanções: no submundo dos educadores, principalmente aqueles
em fase terminal de dependência pedagógica profunda, não há lei, ameaça de
castigo terreno ou celeste que os impeça de fazer o que for necessário, sem
maiores escrúpulos. A dependência é severa mesmo e a gente faz qualquer coisa
pra ver surgir no olho do aluno aquele brilho, seguido de um Ahhhhhh!,
indicativo de que ele entendeu e aprendeu alguma coisa!
E então? Quem se habilita a comandar essa cruzada?
Ressuscitemos a Princesa Isabel e vamos abolir as leis de direito autoral sobre
o uso educacional de seja lá o que for. Acordemos o Newton pra ele calcular a
força gravitacional do peso a diminuir sobre as consciências dos professores.
Eles continuarão carregando o peso dos livros e dos diversos materiais que
levam para sala de aula. Se der pra diminuir o peso da condenação terrena ou
divina já seria bom demais.
O paraíso mesmo seria fazer vir do mundo dos vivos ou mortos
um filósofo e um químico que, trabalhando em interdisciplinaridade, transformassem
todo o peso da culpa em ouro porque, em termos de salário, nem mesmo Newton
mostraria que há planeta no universo em que a lei da gravidade faça com que o
peso de quase nada fique muito maior que zero. Seja na matemática de Einstein
ou dos salários, multiplicação por zero, continua dando zero, não tem jeito!
Isso quer dizer que nós, pobres professores, e pobre aqui deve ser entendido no sentido
literal que conheceram Camões ou Machado de Assis, não teremos nem o suficiente
para pagar a fiança. E, se tivéssemos, desconfio que gastaríamos tudo em
contrabando de lápis, caderno e giz para dentro das prisões a fim de dar aula
para os outros detentos.
Uma vez que a gente entra pro mundo do crime, não consegue
(nem quer) sair mais!
1º
colocado da categoria Funcionário no concurso Revele seus outros talentos, edição 2014, PUCPR