sábado, 1 de janeiro de 2011
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
A magia de vez em quando reaparece
Acho que um dia voltarei a escrever, mas por enquanto, não dá.
Então, vivo um pouco minhas criatividades do passado, as muitas coisas que fiz num período em que fiz muita coisa mesmo! O período em que esse blog nasceu e foi engordando, até chegar a essa dieta que o mantém vivo só por estar ligado aos aparelhos. É que a esperança de que ele um dia volte a viver ainda não morreu, essa danada, que resiste, resiste, resiste! Então, tá. Que ela fique aí resistindo...
Enquanto isso, como disse, aproveito as produções do passado.
Esses dias, passeando pelo blog da minha amiga Patrícia li um post em que ela falava de um outro blog, chamado Banana Craft que publica de tempos em tempos festas de aniversário como antigamente, isto é, quando a gente fazia tudinho e não alugava simplesmente um buffet ou coisa parecida.
Nada contra os buffets! Já usei várias vezes e usarei outras tantas, é uma das coisas mais práticas que já inventaram, aliás, faz parte da minha lista de grandes inventos da humanidade! Mas fazer decoração de festa infantil é uma coisa que eu adoro, já tive até sonhos de ter um negócio assim, então, quando dá, eu mesma faço a decoração das festas das crianças.
Em 2008 foi a vez da Ana Luíza, como já tive a oportunidade de contar por aqui.
Como a proposta do blog Banana Craft é falar de festas handmade decidi mandar minha história, e não é que gostaram dela?
Então esta aí, mais uma das minhas artes de um passado recente.
Enquanto não volta meu tempo pras palavras, nem pras tesouras, nem pros pinceis, vou relembrando o tempo em que eles estiveram tão presentes que me permitiram criar tanta coisa legal. Um dia eles voltam, sei disso!
domingo, 7 de março de 2010
40 pensamentos em 40 anos de vida
1. A coisa mais difícil de encontrar na vida é o equilíbrio.
2. Só o que é possível me faz sofrer. A partir do momento em que percebo que algo é impossível, deixo de sofrer por isso. Sofrer pelo impossível é inútil.
3. Eu alcancei quase tudo o que desejei. Mas isso só aconteceu quando deixei de pensar obsessivamente nesses desejos.
4. Sempre que desejei algo e não alcancei, depois percebi que não teria sido bom pra mim.
5. Amigos são circunstanciais. Família é pra vida toda.
6. Mas há amigos que também são pra vida toda, seja qual for a distância que estiverem de mim.
7. Não há como apressar a experiência de vida, assim como não se pode apressar a gestação de um ser.
8. Foi quando fiquei muito longe do meu país que mais aprendi sobre ele. A compreensão de muita coisa exige distanciamento.
9. Tentar resolver problemas que ainda não tinha muitas vezes só fez com que aparecessem problemas que passei realmente a ter.
10. Só os sobreviventes têm cicatrizes. Quem não tem cicatrizes, ou nunca lutou, ou já morreu.
11. Eu não estou livre de ter os mesmos sentimentos ruins que tanto critico nos outros. Aliás, muitas vezes acabei fazendo exatamente aquilo que critiquei no outro.
12. Os monstros dos quais tive mais medo sempre eram muito mais assustadores na imaginação do que na realidade.
13. Todas as pessoas têm sempre alguma coisa incrível pra contar sobre a vida delas.
14. A generosidade não é desinteressada.
15. Buscar a perfeição só me deixou mais imperfeita.
16. A maternidade não me tornou sobre-humana. Eu continuei a sentir cansaço, raiva e dor, mesmo em relação aos meus filhos.
17. Mas, me sentir humana sendo mãe, só me tornou mais livre e acho que fará com que eu sofra menos a solidão no futuro. Não cobrarei presença dos meus filhos porque saberei que eu mesma não dei de mim o que eles gostariam de ter tido.
18. Ter filhos é perder a chance de ser arrogante. Os filhos me mostraram o quanto sou falível.
19. Qualquer situação, por pior que seja, tem sempre um aspecto positivo a considerar. Basta procurar.
20. O bem mais precioso que possuo é meu tempo. Só que o tempo que tenho nunca vai ser suficiente pra eu fazer tudo o que tenho vontade.
21. O conhecimento inebria e propicia momentos de extrema felicidade. Mas quanto maior o conhecimento, mais raras são as ocasiões de sentir essa felicidade porque mais absurdo parece o mundo.
22. Saber que outras pessoas têm problemas maiores do que os meus não diminui a dor que sinto.
23. Entretanto, sempre que consigo rir das minhas próprias mazelas, tudo fica menos difícil.
24. Não importa o tamanho da bolsa ou da mala, sempre vou enchê-la.
25. O corpo tem limites. E é muito difícil conviver com eles.
26. Cada idade tem alguma coisa muito legal que só é possível de ser vivida plenamente naquela idade.
27. Criar e alimentar expectativas só estraga a vida.
28. Não dá pra manter a proximidade com todas as pessoas que eu gostaria da maneira como gostaria.
29. Trabalhar no que eu gosto garante muitas horas de diversão no dia.
30. Eu não preciso de tudo o que compro.
31. Mas de vez em quando é muito bom comprar coisas das quais não preciso!
32. A rigidez de crenças e comportamentos só fez com que eu me quebrasse mais rapidamente.
33. Meu pior inimigo, aquele que é mais cruel é o senso comum. Como contradizer o senso comum? Como lutar contra o que é invisível e que, mesmo assim, sufoca?
34. A melhor forma de gastar meu dinheiro é com cursos e viagens. Ninguém pode roubar de mim o que vivi e aprendi.
35. Os filhos não têm de participar das discussões dos pais.
36. A maioria daquelas mensagens filosóficas de autoajuda é verdadeira. Mas elas são quase todas muito chatas!
37. Assistir ou ler jornais me deixa infeliz. Então não assisto. O que for realmente importante vou ficar sabendo, no nível de detalhe em que preciso saber. Nem mais, nem menos.
38. Os momentos em que eu mais ganhei vida, foram aqueles em que perdi meu tempo com bobagens inúteis.
39. As pessoas que têm sorte são as que acreditam que ela existe.
40. A maior parte das coisas que aprendi foi vivida desde que nasci, mas só ficou realmente clara nos últimos anos.
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
Criança é feita de poesia
terça-feira, 9 de junho de 2009
Será que ainda existo?
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
Ponto final. Seguido de reticências...
Há dias que a gente sabe que mudarão nossas vidas. Antecipamos a sua importância e esperamos por eles. Assim é com casamento, formatura, nascimento dos filhos... Entretanto, existem aqueles dias que marcam profundamente a nossa existência, mas cujos créditos só podem ser dados depois. Às vezes, bem depois.
Quando aconteceu aquela catástrofe da Tsunami na Indonésia, o que vi pela televisão foram as imagens da destruição. O que sobrou depois que o mar explodiu sua fúria sobre a terra. De acordo com as descrições dos jornais, eu imaginava que a Tsunami tinha sido uma onda inesperada, sim, mas gigante. Como um Godzilla que tivesse levantado subitamente do fundo do mar azul e despencado estrondosamente seu corpo sobre as cidades indefesas e seus cidadãos desavisados.
Porém, um ano depois do ocorrido, assisti a um documentário que mostrou imagens do momento exato em que a tal onda invadiu as cidades. Eram imagens de turistas e moradores que estavam por ali com suas câmeras a postos para registrar alegres férias de verão e que viram aquela água vindo, vindo, vindo...
A tal da Tsunami não chegou na forma de uma onda imensa como as que assombram meus pesadelos. Pelo menos, não naquele 26 de dezembro de 2004. Era uma onda baixinha. Aparentemente inofensiva. Tanto que algumas pessoas ficaram filmando a sua vinda, outras observaram sua chegada na beira da praia sem a menor noção do que estava a caminho. Quanto a nós, sabemos o resultado da sua passagem devastadora. Pouco ficou de pé e o que restou não era mais a mesma coisa. A onda veio, invadiu, carregou e, mesmo com uma dimensão física relativamente pequena, atingiu as estruturas de sustentação de edifícios que ruíram, alguns em parte, outros por completo. Praticamente uma reedição do episódio Davi contra Golias.
Tive também a minha Tsunami particular. E ela chegou exatamente no dia 19 de junho de 2007, uma terça-feira como outra qualquer e que transcorreu sem nada de especial até que, ao voltar para casa à noite e sentar no chão para brincar com a Ana Luíza, encostei acidentalmente no meu seio esquerdo e senti um caroço que nunca tinha estado lá.
Hoje, vinte meses depois, sou capaz de reconhecer a importância daquele 19 de junho na minha vida. Talvez seja surpreendente para alguns o fato de que não considero, nem jamais considerarei, aquele como sendo o pior dia da minha vida. Da mesma forma como não tenho na minha biografia um dia específico que eu possa classificar como tendo sido o melhor de todos.
Dizer isso, para mim, soa como fim de festa. Se eu acreditasse na felicidade ou tristeza absoluta e inegável de um único dia que, ainda por cima, já passou, sentiria que o que havia de mais importante para acontecer já aconteceu e que eu estaria dali em diante vivendo a benevolência de uma espécie de minutos de acréscimo do Grande Juiz. Não! Prefiro pensar que tive momentos muito felizes e muito duros no passado, mas que minha vida não está lá atrás de maneira alguma. Tampouco está à minha frente. Minha vida está aqui, agora, neste momento em que inspiro e expiro. Ela acontece nesta mesa de café de um shopping, no instante exato em que escrevo este texto. Definitivamente, minha vida não está no futuro e esse foi um dos muitos e grandes aprendizados desse câncer.
A partir do dia em que a morte deixa de ser uma possibilidade incerta no tempo e passa a ser uma mera questão de probabilidade estatística, as coisas todas ganham e perdem boa parte do sentido que sempre tiveram. Sei que muitos livros de autoajuda dizem isso. Recebo dezenas de e-mails todas as semanas que repetem essa ideia de todas as formas. Mas uma coisa é ler e pensar sobre a nossa finitude. Outra, bem diferente, é vivê-la concretamente. Ter nas mãos um papel que transforma a crença de haver um resto dos nossos dias a viver numa eventual porcentagem de sucesso ou fracasso na capacidade de defesa do organismo muda tudo. E não há livro ou pensamento que nos prepare para esse momento. Não há nada que indique qual será a nossa reação, ou qual atitude adotaremos desse dia em diante. Não há como ter noção da intensidade da força dessa onda que atinge a nossa vida ou exatamente qual será o resultado da sua passagem por nós.
A única coisa certa é que todas as estruturas serão abaladas, crenças arraigadas serão destruídas, sentimentos, emoções, identidade, tudo mudará no todo ou em parte. Mudará por dentro e por fora. Mudará para quem está próximo e para quem está distante. A única certeza possível é que depois de viver essa experiência, emergirá uma nova pessoa, construída sobre novas bases, e o que, ou como ela será, assumirá a forma de um gigantesco ponto de interrogação.
Acredito que um câncer não é a única situação capaz de provocar tamanho abalo. Nos poucos segundos que levei para escrever essa frase lembrei de três ou quatro outras situações igualmente transformadoras. Tão ou muito mais terríveis do que esta pela qual passei. Realmente, viver um câncer é terrível, mas a cada dia, menos assustador.
Sou e serei eternamente grata à medicina e aos médicos que cuidaram do meu corpo. Assim como serei igualmente grata aos profissionais que cuidaram da minha mente. Infinitamente grata eu serei às dezenas, e dezenas, e dezenas, e dezenas de pessoas conhecidas e desconhecidas, declaradas e anônimas, que cuidaram do meu espírito!
Viver essa experiência traz dor, é claro. Mas traz recompensas em iguais proporções, desde que estejamos de corpo, mente e alma abertos para reconhecê-las.
Por um tempo, perdi minhas forças e minhas defesas. Por alguns meses, perdi meus cabelos e meus cílios. Em vários momentos, perdi a mim mesma para me reencontrar, ora ferida, ora guerreira, no sobe e desce incessante do humor, da fé e da angústia. Em algumas noites, perdi o sono. Para todo o sempre, perdi uma parte de mim, do meu corpo de mulher.
Mas cada perda trouxe consigo uma conquista. Ganhei apoio, ganhei carinho, ganhei confiança em mim e na minha capacidade de luta. Ganhei amigos, ganhei experiência. Principalmente, ganhei mais uma chance de vida!
Ter sobrevivido a um câncer não faz de mim uma pessoa especial. Não sou melhor, nem pior, do que qualquer outro ser humano que divide comigo o espaço neste mundo, cada qual com seu programa de aprendizado, nunca muito fácil, a seguir. Mas, quando paro diante do espelho, não posso negar que sinto orgulho da pessoa que vejo refletida ali. Cheia de virtudes e de defeitos, com os quais, principalmente esses últimos, consigo agora conviver e que sou capaz de aceitar com humildade. Sinto que sou vitoriosa e que terei para sempre esse momento de glória na minha biografia.
Entretanto, por melhor que seja o filme, uma hora ele tem de chegar ao fim. Não quero, de maneira alguma, viver o resto dos meus dias sobre as glórias do passado. Por isso precisava botar um ponto final nesse capítulo e isso foi feito no dia 20 de fevereiro de 2009. Exatos vinte meses depois da chegada da minha Tsunami particular. Fim dos exames, fim dos tratamentos, fim das cirurgias. Fim!
Imagino que essa experiência me levará a viver outras tantas como consequências diretas dela. É claro que meu caminho daqui por diante será marcado pelas limitações que antes eu não tinha. Será igualmente pontuado pelos controles que antes eu não fazia. É evidente que terei as passagens periódicas pela Casa Assombrada (o laboratório de exames) na qual terei encontros marcados com meu Gasparzinho particular. Mas essas serão outras histórias, novos capítulos.
Acredito a cada dia com mais força que preciso colocar pontos finais nas tramas que escrevo na vida. Encerrar ciclos. Renovar enredos. Por isso quis marcar esse fim. E fiz isso na sexta-feira passada de maneira muito especial e significativa.
Quem me acompanha há tempos vai se lembrar das comemorações oficiais aqui de casa, porque já tive a felicidade de anunciar outras tantas boas notícias. Semana passada foi, portanto, dia de comemoração oficial e de gala, ligeiramente alterada na forma, porque as crianças estão crescendo e já manifestam algumas vontades, mas totalmente inalterada na essência. Sexta-feira passada foi dia de tigelas de brigadeiro invadidas por quatro colheres gulosas no sofá da sala, com filme da Disney na TV.
A felicidade é uma coisinha realmente banal!
Agora é guardar lembranças, fechar caixas, sacudir migalhas, virar a página, respirar fundo e levantar o olhar aguardando ansiosamente as cenas (absolutamente inéditas!) dos capítulos que estão por vir...
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terça-feira, 10 de fevereiro de 2009
Pitanguy desempregado
Notei que de uns tempos para cá isso mudou. Cada vez mais temos orgulho em revelar a própria idade. Na verdade, o que queremos é receber a recompensa pelos valores astronômicos que gastamos em cremes e tratamentos, os louvores pelas horas de sofrimento na esteira e o justo prêmio pela resistência ferrenha às pizzas e aos brigadeiros. Não existe uma única torta de chocolate neste mundo que seja mais doce do que a frase Nossa! Não parece!, ouvida quando declaramos nossa idade.
É verdade que escutar isso pelas primeiras vezes está longe de ser alentador... Mudar do Como você cresceu! da infância para o Você não mudou nadinha! da maturidade não é nada fácil. Requer dose cavalar de extrato concentrado de Pollyanice na veia.
Só que essa juventude quase eterna que alcançamos a duras penas tem gerado situações, no mínimo, engraçadas. Dessa vez os causos não se deram comigo, mas com minha mãe e com uma das minhas tias.
Primeiro, minha tia Maria Helena. No frescor dos seus 70 anos, e quem a conhece sabe bem que quando digo frescor não estou exagerando em nada, ela se postou no fim de uma fila para idosos e foi imediatamente barrada por uma mulher muito carrancuda, que lhe disse:
- A senhora não viu que essa fila é especial para grávidas, deficientes e idosos?
- Vi.
- A senhora não está grávida, nem é deficiente, e só é considerado idoso quem tem mais de 60 anos.
- Exato! Está aqui minha identidade: eu tenho mais de 60 anos.
E a mulher, sem desmanchar uma única ruga do rosto fechado, disparou:
- Mas como é que a senhora consegue?
Em primeiro lugar, não sendo tão mal-humorada, minha filha. Isso é o que minha tia deveria ter respondido. Mas é exatamente por manter sempre o alto astral que ela tem aquela aparência e uma frase dessas jamais sairia de sua boca. É uma pena que eu tenha por princípio não divulgar fotos pessoais de conhecidos por aqui. Com uma foto vocês poderiam comprovar que não exagero em nada quando digo que minha tia, aos 70, poderia facilmente dizer que se inspirou nos modelitos de começo de carreira da Madonna nos seus 15 anos.
Semana passada aconteceu algo semelhante, desta vez com minha mãe.
Primeiro foi na fila do supermercado: duas mulheres começaram a, no início, cochichar. Em seguida, a falar um pouco mais alto. No fim, não resistiram, cutucaram minha mãe, e lá veio a repetição do script: A senhora não está vendo que esta fila é para idosos e blá, blá, blá... Dessa vez o final da história foi mais doce: começou com o Nossa! Não parece! e continuou num animado papinho com trocas de receitas de longevidade entre os participantes das filas vizinhas. Quase que tudo acaba em pizza de chocolate diet num spa!
No dia seguinte, menos de vinte e quatro horas depois desse incidente sem grandes consequências, minha mãe me levou ao médico porque, depois de uma cirurgia simples, eu estava impossibilitada de dirigir, andar pendurada em corrimão de ônibus, ou mesmo fazer longas caminhadas. Naquele dia ela era minha motorista particular e ficamos felicíssimas por encontrar, milagrosamente, uma vaga para estacionar o carro em pleno centro da cidade, exatamente na entrada do prédio em que ficava o consultório do médico. O detalhe é que nessa vaga estava escrito em letras garrafais, letras essas que nem com toda catarata do mundo deixaríamos de ver, a palavra IDOSO. Minha mãe já é, como ela mesmo diz, sexy, ou seja, sexagenária. Portanto já passou, embora não muito, dos 60 e estava no pleno direito de estacionar ali. Sem contar a minha própria presença, uma quase inválida naquela dia.
Nem bem ela desembarcou, ouviu uma buzina insistente. Viu um homem exaltadíssimo dentro de seu carro, fazendo gestos nervosos com os braços. Muito pacientemente, foi até a janela do distinto senhor para ouvir o que ele dizia:
- ... enxerga, não? Não tá vendo que essa vaga é pra idoso? Mas que cara de pau!
- Idoso é quem já passou dos 60, não?
- Isso mesmo!
- Eu tenho 62 anos.
- Essa mentira a senhora vai contar lá pro guarda, onde já se viu! Não vem com essa pro meu lado! Tá pensando o que eu sou palhaço? E blá, blá, blá....
Ela nem pôde dar sábios conselhos ao distinto e educado cavalheiro, dizendo que se ele continuar tão estressado ficará longe de vez das vagas para idosos nas ruas da cidade e terá de torcer muito para que essa lei já tenha chegado ao paraíso. Ou ao inferno. Mas eu desconfio que o capeta não tem esse tipo de preocupação... Enfim, morrendo de rir, ela deixou o motorista bradando seus impropérios sozinho e partiu tranquilamente. Atitude, aliás, fundamental para quem quer ter a chance de viver momentos como esses.
Confesso: tenho lá minhas crises de mau humor. Mas até que elas são bem-humoradas às vezes. Prova disso é meu mais recente projeto de patchwork, o qual acabo de desenhar e que, espero, em breve estará fotografado e disponível para minhas amigas quilteiras. Trata-se de um TePerMômetro! Um painel a ser pendurado na porta de casa e que indicará a quem chegar a quantas anda meu nível de TPM. Acredito que será extremamente útil, especialmente para meus filhos. Dependendo da temperatura mostrada no painel, o mais prudente para eles será mexer o esqueleto imediatamente ao primeiro suspiro que eu exalar no sentido de chamar um dos dois à minha presença. Se o tepermômetro estiver marcando níveis altíssimos, e se eles quiserem ter a chance de um dia usar em pelo direito a vaga ou a fila especial para idosos, então é melhor que apareçam sem demora! Se possível, que antecipem os meus chamados. É ou não é um mau humor bem-humorado?
A grande verdade é que, quando faço uma análise genética de avós, mãe, tias e primas, no intuito de estabelecer prognósticos para minha própria aparência no futuro, fico na maior felicidade em ver que posso detonar sem medo aquela poupança que vinha fazendo para as cirurgias plásticas. Se a Genética for disciplina séria como parece, vou poder torrar tudo em coisas bem mais divertidas que, ainda por cima, aplacarão minhas crises de mau humor! Não é genial? Pitanguy não vai me ver nem de perto, nem de longe! Ficarei alegrinha, sem rugas, e tanto meus filhos como o espelho agradecerão aliviados. Oba!
Por via das dúvidas, e para evitar espancamentos, que o Alzheimer me livre de esquecer de manter meu RG sempre ao alcance das mãos!
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domingo, 28 de dezembro de 2008
Sim! Descobri como voltar a ser criança!
Esta semana foi aniversário da Ana Luíza e quem ganhou o presente fui eu! Ela quis comemoração com tema de fada e eu entrei num mundo cor-de-rosa, púrpura, fúcsia e furta-cor, cheio de glitter e de coisas brilhantes. Tudo o que eu precisava neste fim de ano era passar dias de fantasia depois de meses repletos de realidade. Preparei uma decoração cheia de fadinhas, flores, luzinhas coloridas, bolhas de sabão, roupa de fada e flutuei como Sininho, que agora mudou de nome e se chama Tinkerbell...
Enquanto percorria as lojas da cidade atrás de tudo o que pudesse usar nessa decoração, escutei vezes sem conta o eterno comentário de todo dezembro: Nossa! Já é Natal de novo e eu nem vi o ano passar! Pois quero declarar aqui que vi meu ano passar. Diferente do que me acontecia nos últimos tempos quando um Natal se sucedia ao outro sem que eu percebesse, neste ano fui criança de novo. Meu Natal demorou muuuuuuito para chegar.
Sempre achei que o fato de correr de um lado para o outro era o que fazia com que o tempo passasse tão rápido para nós, adultos. Achava que a agenda vazia das crianças era a responsável por fazer o tempo delas andar lentamente, mas estava enganada! Poucas vezes na minha vida tive dias tão corridos como neste ano em que quase enlouqueci e, no entanto, 2008 passou absurdamente devagar. Voltei aos meus tempos de infância!
Para as crianças o tempo não passa devagar. O que acontece é que todos os dias elas fazem alguma coisa nova, alguma coisa que nunca fizeram. Isso torna cada dia diferente do anterior. Como os dias são todos diferentes uns dos outros, então elas os vivem conscientemente. Elas vivem os 365 dias entre um Natal e outro! Portanto, o que faz o tempo passar rápido é a mesmice. Uma sucessão de dias idênticos. É quase como se, de dezembro a dezembro, houvesse um único e longo dia. É por fazer todos os dias a mesma coisa que ao chegar ao fim de um ano achamos que o tempo passou rápido demais.
Comprovei essa teoria sendo meu próprio ratinho de laboratório. Em 2008, procurei fazer coisas diferentes, coisas que nunca tinha feito. O resultado foi ter novamente a sensação de que meu Natal demorou uma eternidade para chegar, como quando eu era aquela menina que esperava ansiosamente pela vinda do Papai Noel... E não é uma questão de dinheiro. Não só de dinheiro, pelo menos. É principalmente uma questão de vontade de viver. Viver cada momento de maneira consciente.
Nesse ano que passou eu trabalhei muito. Demais. Exageradamente! E mesmo assim, fiz com que meus dias fossem diferentes uns dos outros...
Usei cores e tipos de roupas que nunca tinha usado. Usei cores nas roupas. Usei cores na maquiagem. Usei pelo menos sete cores diferentes de esmalte que jamais tinham passado pelas pontas dos meus dedos. Transformei meus dias num imenso arco-íris. Andei descalça na grama do Parque Barigui. Sentei embaixo de uma árvore e fiquei encostada no tronco, deixando que o sol queimasse o meu rosto. Caminhei por ruas da cidade que não conhecia. Fiz caminhos diferentes para percorrer percursos iguais. Por não ter mais um carro, quase só ando de ônibus ou a pé. Seja a pé ou seja no ônibus, viajei sempre olhando para cima, observando os prédios dessa cidade onde nasci, mas que pouco conhecia. Observei a fisionomia das pessoas, bisbilhotei a conversa alheia, prestei atenção às opiniões, às conclusões, aos raciocínios. Conversei com muitos estranhos e, nem que fosse por apenas dez minutos, prestei imensa atenção às suas histórias. Descobri que as pessoas têm histórias riquíssimas de vida pra contar. Perguntei sobre seus trabalhos e percebi quantas profissões diferentes existem e quantas coisas não sei fazer. Testei receitas novas. Fiz um jantar para doze pessoas com aperitivo, entrada, prato principal, queijo, sobremesa, café, chocolates e bolachinhas. Iluminado por velas perfumadas. Experimentei frutas que nunca tinha experimentado. Fiz geléias de laranja, limão, morango, jabuticaba e figo. Comprei marmelos e fiz marmelada. Escutei músicas que nunca tinha escutado de cantores que não conhecia. Ouvi novamente CDs que há anos estavam guardados. Assisti a filmes que já tinha visto e também a outros que queria ver mas sempre adiava. Usei roupas que há décadas não usava, assim como dei outras que acreditava que um dia ainda usaria. Conheci mais de vinte cafés diferentes na cidade e, em cada um deles, tentei pedir alguma coisa que nunca antes tivesse provado. Elegi um dia da semana para almoçar com amigos e procurei encontrar pessoas que não via há muito tempo. Quando não foi possível encontrar algum amigo nesse dia reservado, almocei em grande companhia: eu mesma e meus pensamentos. Dediquei várias horas a meus pensamentos sem achar que preciso sempre estar fazendo alguma coisa para me sentir útil. Organizei um churrasco para meus companheiros do ensino médio e pudemos constatar que amizades verdadeiras não morrem com o afastamento dos corpos. Juntei os e-mails trocados com um grande amigo em um único arquivo e escrevi o livro da nossa vida. Comi queijo e bebi vinho em dia de semana sem motivo nenhum. Tomei uma garrafa de vinho sozinha (experiência a não ser repetida em 2009!). Pulei numa cama elástica. Fiz uma aula de Hip-Hop. Comecei a fazer aulas de dança. Reorganizei os livros na estante. Visitei cidades às quais nunca tinha ido. Tirei milhares de fotos. Olhei fotos antigas. Fiquei hospedada na casa de pessoas que não conhecia pessoalmente. Abracei amigas que só conhecia virtualmente. Caí de uma cadeira e morri de rir. Quebrei uma taça na casa de uma amiga, espalhei a ração dos cachorros dela pelo chão. Fui ao salão fazer maquiagem para ir a um aniversário. Arrumei o cabelo em dia que não tinha festa. Corri de salto alto pela calçada. Fiz bijuterias. Fiz meu mapa astral. Consultei um tarólogo. Tomei florais. Escutei mantras. Encarei desafios profissionais. Andei de elevador com o Governador. Conversei com um senador, com um cônsul, com dois escritores. Enviei textos para seleções, entrei em algumas, fui negada em outras. Publiquei um trabalho em uma revista de patchwork. Escrevi dezenas de cartas e centenas de e-mails falando da vida, falando de mim, falando do outro. Espalhei bloquinhos por vários lugares e anoto ali todas as idéias que me passam pela cabeça: de novos projetos de patchwork a soluções para os problemas do mundo...
Dito assim pode parecer que meu ano foi só felicidade. Nada disso! Tive acessos de cólera. Pedi perdão a muita gente, inclusive a meus filhos. Enviei flores brancas em sinal de paz. Sufoquei meu superego e me concedi o direito de não ser perfeita: deixei de entregar trabalhos, faltei aulas na universidade, cheguei atrasada. Fiz isso porque percebi que meu corpo tem um limite e que precisa descansar. Permiti que meu corpo descansasse mesmo que isso significasse deixar algo por fazer e muita coisa ficou por fazer... Fiz promessas que não cumpri. Tive momentos duríssimos. Senti raiva e deixei que ela saísse. Senti tristeza, medo, solidão, mágoa, abandono... A diferença é que não tentei fazer de conta que nada estava acontecendo. Quando a tristeza veio, abri o peito e deixei que ela me invadisse. Chorei sozinha. Chorei acompanhada. Chorei escondida e também na frente de um monte de gente. Afundei na autopiedade e me senti abjeta. Vivi intensamente cada segundo da minha amargura para vivê-la toda de uma vez. Um dia acordei e percebi que ela tinha ido embora. A felicidade é um contraste em relação à tristeza. Sem nunca estar triste, como perceber que se está feliz?
Mas o que fiz de mais importante neste ano de 2008 foi deixar a generosidade entrar na minha vida. Generosidade comigo mesma. Percebi, abismada, que durante a maior parte dos anos que vivi anteriormente, o que mais disse a mim mesma foi uma infinita sucessão de nãos. Não posso, não consigo, não mereço, não tenho o direito, não faz sentido, não é justo, não é certo... Não, não, não... Sufoquei a mim mesma e a meus desejos sob toneladas de nãos até que uma duplinha formada de preposição e pronome interrogativo veio se juntar a esse advérbio. Um simples por quê? Por que não? Foi então que um Sim ainda muito tímido, atrofiado e pálido por conta dos anos enfurnado num quartinho escuro começou a dar o ar de sua graça na minha vida.
2008 foi o ano em que o Sim! entrou no meu vocabulário. E foram vários deles que disse a mim mesma nesses meses que passaram. O maior deles há poucas semanas...
Que venha 2009! Quero preencher os seus dias com muitas outras experiências para fazer com que o próximo Natal, assim como o próximo aniversário da Ana Luíza, demore uma eternidade para chegar. Quero ter muito tempo para andar de braços dados com esse Sim que acabei de conhecer.
Não faço mais promessas de ano novo. Agora só estabeleço desejos de ano novo. As promessas sou eu quem tem de cumprir. Os desejos pertencem em parte ao destino... Então, um 2009 repleto de novas experiências e com a presença do Sim a cada dia é o que eu desejo para todos nós!
Até o ano que vem!
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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
Foi ontem, mas tudo bem...
Começo, então, por agradecer aos meus filhos, Ana Luíza e Felipe. Eles não lêem esse blog, nem imaginam que ele existe, nunca leram meus textos. Mas cada tempo que dedico a alguma coisa, é tempo tirado deles. Como me dedico a várias coisas, são vários também os tempos que surrupio dos dois o que, obviamente, me enche de culpa. Quando me ausento por conta de trabalho, tudo bem, aplaco um pouco minhas crises de consciência. Mas escrever por aqui é ato de puro prazer, então, lá vêm as chibatadas morais que me aplico todos os dias. Agradeço, portanto, à compreensão dos dois, ao fato de eles continuarem a gostar de mim, apesar das minhas ausências que nos últimos meses chegaram a níveis insuportáveis.
Aos meus bleitores, ou seja, todas essas pessoas conhecidas e anônimas que passam por aqui uma vez, algumas vezes ou muitas vezes. Aos que deixam comentários sempre, aos que comentam apenas uma vez, aos que me mandam mensagens, aos que me escrevem no Orkut, aos que falam pessoalmente comigo e aos que não dizem nada, apenas chegam de mansinho e aceitam conhecer um pouco de mim. Desde abril tenho um contador de acessos que me mostra uma série de coisas interessantes. Entre elas, a média de acessos diários. Comecei com 11 acessos e hoje estou em 20. É um crescimento inesperado para mim e me anima a continuar. Tenho bleitores internacionais, vejam só! Alemanha, Austrália, Suíça, França (sei quem são todos vocês!)... E todos os meus bleitores brasileiros, de norte a sul do país, alguns que me surpreendem imensamente quando descubro que me acompanham. Tudo isso me impressiona, de verdade!
Ao escritor, poeta, cronista, professor e ser humano singular Fabrício Carpinejar. Uma série de acasos fez com que nos encontrássemos pessoalmente por algumas horas em Curitiba em novembro do ano passado. O que conversamos naquele dia me encheu de coragem e, por causa daquela conversa, comecei este blog. Deu no que deu. Um aninho, com direito a textos publicados em livros e grandes planos para o futuro. Fabrício, acho que você nem imagina que teve participação tão grande nesse processo! Espero que um dia possa ter também participação nos lucros! :-)
À minha amiga Giuseppina Loffredo. Ela tem um blog também, mas prefere ficar incógnita. Há anos (em torno de cinco para ser um pouco menos inexata) me mandou um e-mail dizendo: Decidi contar a história da minha vida e quem vai escrever o livro é você! Ela não foi a primeira a mencionar que eu devia escrever, mas foi a mais insistente. É minha parceira nas artes dos retalhos e também na das letras. Mais do que isso, é parceira na vida, de uma forma que me desconcerta, às vezes.
Mariane Corbetta é outra amiga, também blogueira, também incógnita. Mas tinha de ser mencionada aqui. É minha comentadora mais assídua! Mas principalmente, veio dela o incentivo para participar da primeira seleção, que gerou minha primeira publicação, e tudo o mais que veio depois! Nossos caminhos, certamente, não se cruzaram por acaso, Marie. Embora a forma como tenhamos nos conhecido tenha sido exatamente assim: um gigantesco acaso!
Last but not least, em absoluto, a Vidal, meu marido, companheiro, parceiro, cúmplice. Presença constante e firme. Sinaliza sempre o norte, mesmo quando me perco e depois me acho, vagando em tantas direções. Atravessou esses anos comigo e esteve sempre ao meu lado, assim como eu estive ao lado dele. Não sei como nos classificar. Já fomos idênticos e também totalmente opostos. Daqui por diante, não imagino como seremos. O que sei é que hoje resta pouco da mulher com quem ele se casou há quase quinze anos e mesmo com toda a ebulição, transformação e estremecimento pelos quais passei, e continuo a passar, ele, ainda assim, quer estar ao meu lado. Sou uma mulher de sorte!
Que venha um novo ano. Que ele seja tão cheio de surpresas como foi este. Que eu continue a ter idéias, mas principalmente, que eu continue a encontrar tempo pra escrever por aqui. Isso economiza muito em terapia!
Vou assoprar velinhas, comer brigadeiros e recolher mais palavras soltas por aí!
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
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Tudo o que eu queria era poder ver um jogo Atlético-PR x Corinthians no ano que vem!!!
E saiu melhor do que o esperado: ficar na primeira e ainda participar da Sulamericana? Só espero que meu amigo torcedor do Internacional retribua a gentileza deste ano!
Fim de semana em São Paulo: lançamento de livro, muita risada com as amigas, dar abraço real em amiga que até anteontem era só virtual, passeio pela 25 de Março, almoço no Mercado Municipal e mergulho na Livraria Cultura (não tenho mais cartão de crédito: agora tenho cartão de DEScrédito!)... Coroando tudo: um lindo dia de sol!
Para estar tudo perfeito só faltava eu não ter uma pilha de provas para corrigir, ainda algumas aulas para dar e um último e torturante trabalho da faculdade para fazer! Tudo bem! O mundo não é perfeito, mas é um lugar onde a gente é feliz muitas vezes!!!
:-D
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
Freddy Krueger atacando de motosserra elétrica vestido de Papai Noel?!
E, no entanto, dias depois uma idéiazinha muito etérea veio surgindo na minha cabeça, quase como um fantasma... e não é que acabei escrevendo um conto de suspense de inspiração natalina? A gente vive cem anos e nunca chega ao fim das surpresas em relação aos próprios limites!
A boa notícia é que o editor também gostou e agora meu conto faz parte de uma antologia que será lançada no próximo dia 7 de dezembro!
Eu estarei lá, é claro! Quem estiver em São Paulo nesse dia e também quiser aparecer, será uma imensa alegria!
Embora eu não seja nem um pouco chegada a banhos de sangue (e a maioria dos autores dos contos da antologia caprichou nos efeitos especiais) reconheço que há estórias muito boas, daquelas que fazem a gente esconder a cabeça debaixo da coberta na hora de dormir. Para quem gosta do gênero, o livro vale a pena. Para quem não gosta, também! :-) No mínimo é interessante observar as cenas escabrosas motivadas por ceias, pinheirinhos, pacotes de presentes, Papai Noel,.... Brrrrrrrrr! De arrepiar!
Esta é minha segunda publicação em antologias, a segunda também pela Andross. Aproveito para agradecer publicamente ao organizador, Edson Rossatto, pela idéia, pelo empreendedorismo, pela oportunidade e pela imensa capacidade de trabalho! Estou para ver uma pessoa mais online que ele! 24 horas por dia, é de assustar!
Embora seja a segunda publicação em antologias, é a primeira em forma de conto. E é absolutamente inédito, ou seja, nunca apareceu nem neste blog, nem no outro. Para conhecer o desfecho do texto que escrevi cujo título é Cai o véu, vai ser necessário ler o livro! Chantagem? Só um pouquinho para combinar com o clima sobrenatural da publicação...
O livro se chama Réquiem para o Natal e está em pré-lançamento na Livraria Cultura.
Aí vai uma palhinha do conto, pra ninguém dizer que sou malvada... demais!
"A angústia inundou seu peito e ela sentia que alguma coisa muito grave estava para acontecer. Andava de um lado para o outro quando parou subitamente, o espelho às suas costas. O relógio começou a bater novamente, anunciando a meia-noite."
(trecho do conto Cai o Véu que faz parte do livro Réquiem para o Natal da Andross Editora)
Réquiem para o Natal - lançamento
Data
7/12/2008
Local
Espaço WN
Rua Jorge Augusto, 668
São Paulo - SP (próximo ao metrô vila Matilde)
http://www.espacown.com.br/
Horário
das 17h às 20h
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
Esperança

Quis imortalizar também por aqui, porque acho que o nome que ele deu para a foto, que é também título deste post, diz tudo...
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É minha última semana de faculdade. Estou a dois trabalhos e quatro dias de terminar esse curso que comecei em 2001. Eu sou essa frutinha vermelha no meio da neve! A personificação da esperança!
sexta-feira, 24 de outubro de 2008
Será que o Jassa ainda está vivo?
Ah o tempo, o tempo... Por que será que ele decide sumir dessa forma?
Aproveitando que o assunto do último post foram minhas madeixas, faço uma nova sessão Recordar é viver. É a prova de que meus infortúnios capilares vêm de longa data!
O post original é do meu outro blog, dia 19 de fevereiro de 2004. Nossa! Como passa o danado do tempo! E eu nem imaginava o que ainda viria pela frente com relação aos meus cabelos...
Antes de encerrar essa singela introdução, um comentário para matar a sede de curiosidade dos meus bleaders...
Parênteses. Aprendi ontem essa: um bleader é um blog reader. Vamos criar um termo nacional? Que tal bleitores?
Voltando ao assunto, saibam vocês, meus caros bleitores, que depois do evento que vão ler agora, passei um ano cortando eu mesma meu cabelo . Mas como não sou, nem nunca serei, uma boa cabeleireira, um dia capitulei e procurei outro salão. Antoine é o nome da criatura que devolveu um pouco de dignidade à imagem que eu via no espelho. Mas só um pouco... Diferente do Renato, meu cabelereiro brasileiro, o Antoine não tinha nada de mágico nem de santo e não sabia fazer milagres!
Até a próxima! Idéias são muitas, textos começados existem, mas ainda me falta encontrar o mágico ou santo que dará um jeito no meu tempo!
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Um dia desses parei pra fazer uma análise crítica e realista a respeito do meu estado físico geral depois de alguns meses morando na França. Vamos aos resultados:
· Quem inventou o velcro também teve de passar um tempo fazendo faxina, lavando as mãos constantemente, etc. A pele estava tão ressecada que eu já nem precisava mais pegar coisas de tecido, elas simplesmente colavam na minha mão e vinham junto comigo pela casa.
· Fazia tempo que não via minhas sobrancelhas e teria sido melhor continuar sem ver: elas estavam parecendo duas taturanas. Fiz um rabo-de-cavalo e meu primeiro ímpeto foi o de afugentar os bichos que estavam na minha cara. Foi só depois que eu percebi que eram as sobrancelhas.
· Meu cabelo? Sem comentários. A última vez que passou por um salão foi ainda no Brasil. Minhas luzes não passavam de, no máximo, um abajurzinho. A franja estava um verdadeiro caminho de rato, já que tinha feito a besteira de tentar fazer justiça com as próprias mãos, ou seja, cortar eu mesma.
· Para coroar, os quilinhos (dezenas deles) que se apaixonaram por mim e relutam em ir embora.
Apesar de tudo isso, estranhei quando me olhei no espelho e percebi um leve sorriso no meu rosto. Será que estava aprendendo a ser feliz mesmo na adversidade? Foi aí que observei mais de perto e vi que o sorriso, na verdade, era a pele repuxada. Tinha acabado meu creme hidratante.
Decidi dar um basta na situação!
Com as mãos fui radical: passei a usar luvas para tudo, até pra fazer xixi. As sobrancelhas eu mesma dei uma ajeitadinha. Coisa pouca. Só tirei os fios que estavam caindo dentro dos olhos e emendando tudo sobre o nariz, acabando com aquele ar de Frida Khalo. O rosto foi fácil. Fui ao supermercado comprar um creme hidratante. Só que nesta terra tenho um problema grave. Gravíssimo, eu diria. Sou obrigada a usar cosméticos nacionais! Ha ha ha! Essa é a parte boa de estar morando na França: cosméticos, queijos e vinhos, só os nacionais. Que chato! Escolhi um anti-rugas leve, primeiras rugas, coisa para quem acabou de passar dos trinta. Nisso eles são incríveis! É uma prateleira imensa em qualquer mercadinho de esquina com todos os tipos de creme que se pode imaginar. Até um para afinar o rosto que estou pensando em experimentar. Quem sabe eu não consigo acabar com essa cara de lua cheia e não fico igual à Mortícia Adams? Com o cabelo a coisa era mais complicada. Precisava de uma solução profissional!
Na França temos o médico da família (atende a todos nós, até à Ana Luíza), achei que devíamos ter também o cabeleireiro da família. Já tínhamos tentado um que cortou o cabelo do Vidal e do Felipe e, apesar de os cortes não terem ficado maravilhosos, decidi eu mesma testar pra ver se ficaríamos com ele de vez ou procuraríamos outra opção.
Marquei horário. Uma terça-feira. Dezoito horas. O grande dia!
Por causa do resultado não muito bom com o Vidal e com o Felipe eu estava meio cabreira. Mas sentei confiante na cadeira e fiquei esperando pelo chefe. O dono do salão, aquele que me transformaria numa criatura deslumbrante.
Ele chegou e perguntou o que eu queria. Minha resposta convicta foi: Não sei! E era verdade. Fiquei dias pensando como ia querer cortar o cabelo e não sabia o que fazer. Disse que ele podia fazer o que quisesse. Eu só queria manter a franja (bem cortada, é claro). E não queria o cabelo muito curto. Mas que tivesse volume. E que fosse prático para arrumar (com duas crianças não dá pra ficar horas na frente do espelho). Ah! E que, se possível fosse igual ao daquela foto ali na revista. Dei total liberdade, portanto, para fazer o que quisesse.
Ele se armou de tesoura e pente, pegou uma mecha do alto da cabeça e... tac! Cortou pela metade! Gelei na cadeira. Será que meu francês estava tão ruim que quando disse não muito curto acabei esquecendo de falar a negação? Fiquei ainda mais cabreira.
Foi quando chegou o assistente e ficou, como todo bom assistente, assistindo. Quis saber qual era a técnica de corte que estava sendo usada. O cabeleireiro explicou, o assistente disse ahhhn e continuou assistindo.
Aí o tal do assistente fez um comentário que iniciou o momento mais tenso do dia: Uma vez eu vi uma técnica de cortar que era bem estranha. Eles juntavam o cabelo todo em cima e faziam um único corte. O cabeleireiro disse: É verdade! Você faz assim, ó... Juntou todo meu cabelo no alto da cabeça, chegou a tesoura perto e... tac! Ele só falou o tac, não fez o tac. Eu me encolhi alguns centímetros. Ele se empolgou. Começou a descrever todas as técnicas de juntar o cabelo numa parte da cabeça e tac. Só que ele falava e fazia. Junta tudo na esquerda e tac. Junta tudo na direita e tac. Junta em cima, no meio, atrás e tac, tac, tac. Ele não cortava, mas repuxava todo meu cabelo, chegava com a tesoura perto e falava: tac. Além de estar ficando com dor de cabeça, a cada tac daqueles eu apertava os olhos e encolhia mais um pouquinho. O meu medo era que ele esquecesse o corte que pretendia fazer quando começou.
O clímax aconteceu na descrição da técnica em que o cabeleireiro coloca a cliente de quatro sobre a cadeira, joga o cabelo todo pra baixo e tac! Essa foi ele mesmo quem demonstrou. Não ousou me pedir pra fazer isso, mesmo porque, eu me recusaria. Mas fiquei pensando... Isso tudo foi um curso ma-ra-vi-lho-so que ele fez em Barcelona onde ele aprendeu tu-do o que sabe. O que acontece é que quando eu tinha dezoito ou dezenove anos fazia exatamente isso: juntava todo o cabelo no alto da cabeça e... tac! Eu mesma cortava meu cabelo. Se soubesse que essa era uma técnica refinadíssima tinha aberto um salão e hoje estaria rica. Fiquei, se é que isso é possível, ainda mais cabreira. Na verdade, até nem me importaria de ser cobaia, desde que ele não estivesse cobrando (bastante) por isso.
Felizmente acabou a aula. Já nem me via mais no espelho de tão encolhida que estava. Sentei normalmente de novo e ele voltou a cortar. Foi cortando, cortando. Cheguei a achar que ia cortar tudo. Não faz isso, não! É pouquinho, é fininho, mas é tudo o que eu tenho.
Durante esse tempo meus pensamentos se alternavam. Gostei. Não gostei. Detestei!!! Aí, aí, tá bom. Adorei! Não, do outro jeito. Não dá pra colar de novo esse pedacinho?
Ele terminou o corte, Voilà! Eu estava parecendo um fósforo: uma bolinha no alto da cabeça e o resto espremido nos lados do rosto. Já não tinha como ficar mais cabreira. Desisti de me preocupar. Cabelo cresce, não é mesmo?
De secador em punho, começou o processo de secagem e arrumação do cabelo. As mulheres vão me entender, ele girava o secador e amassava os fios, afinal, eu tinha pedido volume, não tinha? Desligou o secador e pegou a lata de spray (detesto spray!). Fiquei sufocada de tanto que ele apertou o dedo naquela latinha. Puxou para baixo, puxou para os lados, para cima. Acabou! Pegou o espelho para que eu pudesse apreciar o resultado na parte de trás. Não vou dizer que eu parecia uma leoa porque aprendi num parque de diversões num passeio de fim de semana que as leoas não têm juba. Mas eu estava parecendo... quem?... Já sei! Toni Tornado quando cantava ... na BR3... Murmurei um très bien meio engasgado, levantei, paguei e saí.
Ainda bem que o salão é na frente de casa e que felizmente não encontrei ninguém pela rua. Abri a porta do apartamento e voei como um raio para o banheiro. O Vidal na sala com as crianças, perguntou: E aí? Fiquei no banheiro um tempo observando. Passei um lápis nos olhos. Um batom. Talvez estivesse estranhando minha cara sem maquiagem. Não adiantou. Peguei uma escova e comecei a tentar tirar aquele spray todo. Foi difícil. Lágrimas de indignação e de dor de tanto puxar o cabelo escorriam dos meus olhos. Pensei em entrar embaixo do chuveiro e arrumar do meu jeito. Mas achei que seria um desaforo! Pagar caro no salão pra chegar em casa e desmanchar tudo? Isso eu fazia no Brasil quando era poderosa. Agora não estou com essa bola toda, não.
Um dia eu teria de reencontrar as pessoas do mundo, então saí do banheiro e entrei na sala para o Vidal dar seu veredicto. Ele disse que com aquela toalha na cabeça não dava pra ver nada. Brincadeirinha! Só lembrei da minha irmã, Renata, que aos oito anos de idade amarrou uma toalha na cabeça quando minha mãe mandou cortar o cabelo dela bem curtinho. Disse que só ia tirar a toalha quando o cabelo crescesse. Só hoje, quase vinte anos depois, consegui compreender a atitude da minha irmã. Tive vontade de fazer o mesmo.
O Vidal olhou. Ficou quieto por alguns (torturantes) segundos e, para meu horror, disse: O que foi que ele fez aí atrás? Quase surtei! Balbuciei algumas explicações para o que não tinha explicação alguma. Ele, gentil, tentou consertar: Nem fez diferença! Foi pior! Como não fez diferença? Quando eu saí tinha todos os fios quase do mesmo tamanho com as pontinhas viradas para baixo. Agora cada um tem um comprimento diferente com as pontinhas viradas para todos os lados!
O padre tinha dito: na alegria e na tristeza, na saúde e na riqueza, na saúde e na doença, não tinha? Faltou acrescentar com o cabelo seja lá como for. O Vidal decidiu ser solidário e acrescentou: Eu também não gostei do trabalho dele. É um cara legal, mas não dá. Vamos procurar outra pessoa... Fiquei um pouco mais reconfortada, mas, por via das dúvidas, decidi cobrir todos os espelhos da casa, afinal, o que os olhos não vêem o coração não sente, certo?
O travesseiro acabou fazendo um bom trabalho. No dia seguinte o cabelo já tinha baixado bem e com o passar dos dias foi ficando praticamente normal. Mas desconfio que ficarei longe de salões por um bom tempo...
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
Pelo menos a voz continua a mesma!
Meus cabelos passaram a ser curtos, o que se chamava à la garçon ou estilo Joãozinho, depende de quão chique tivesse ficado o resultado. No meu caso foi catastrófico. Mas quem é que controla os hormônios em fúria da adolescência que nos faz cometer loucuras?
De lá para cá, com raros períodos de trégua, estivemos em guerra franca e declarada. Devo reconhecer que ele tem sido mais forte do que eu...
Aquela surecada dos onze anos me deixou ainda mais indecente do que já fica indecente uma menina que sai da infância e cresce toda desconjuntada. Tinha pontas para todos os lados. Dessa época só tenho guardada uma foto 3x4 de uma carteirinha de estudante. Será minha arma de persuasão quando a Ana Luíza entrar na adolescência e tiver as mesmas idéias insanas.
Os tais hormônios, além do tsunami emocional que provocaram, atingiram também diretamente os cabelos e fizeram um estrago sem precedentes! Eu tinha fios de todas as espessuras, assim como fios de todos os tipos: dos lisos escorridos ao crespo sarará. Sem exagero. Isso quem descobriu foi uma das inúmeras cabeleireiras pelas quais passei na tentativa vã de dar um jeito naquela gadelha.
O que sei é que minhas memórias dos onze aos dezoito anos no que se refere a minhas melenas são repletas de tentativas de domar a fera enraivecida dos meus cabelos. Um calvário em bem mais de quatorze estações...
Claro que tentei de tudo. Todos os tratamentos que me aconselharam. Abacate batido, por exemplo. Vocês lembram de uma das cenas do filme O Exorcista? Pois é. Ver minha cabeça coberta de abacate batido no espelho me fez pensar em vidrinhos de água benta. E essa nem foi a receita mais esdrúxula que tentei!
Uma vez sugeriram uma mistura de ovo, azeite de oliva e, se não me engano, um frasquinho de vitamina A. Só que era pra aquecer o azeite de oliva. Claro que quando misturei o ovo ele começou a fritar. Dessa vez, a cabeça cheia de pedacinhos de ovo frito me deram uma vontade quase incontrolável de passar novamente pelas tesouras.

Claro que apelei para soluções radicais! Era época dos permanentes e só quem já fez isso pode dizer que sabe bem qual é a eau de cologne que usa Satanás. Mas nem mesmo a química mais pesada conseguiu colocar graciosos cachinhos na minha cabeça. Depois dos permanentes meu cabelo parecia vítima eterna da catástrofe dos bigoudis.

Porém, isso não aliviou em nada a situação porque meus cabelos não eram crespos como eu sonhava, mas também não eram lisos. Eles eram uma... coisa. Uma coisa com aparência de vassoura de piaçava.
Como eu tinha de tentar algo, decidi investir no liso. Haja muque para fazer escova! Vale lembrar que estamos falando do século passado, portanto, absolutamente nada de silicone, muito menos nenhum dos 1834 cremes disponíveis que temos hoje. Era xampu de ovo da Colorama e Creme Rinse, aquele rosinha. E só! E, ah, os hormônios, quem disse que eles deixavam minhas mechas em paz? Nem com escova! Então eu apelava para a touca. Vocês conhecem essa técnica para ficar parecendo a Mortícia Adams?


A lisura durava só até o primeiro ventinho úmido que eu pegava, ventinho esse que sopra em Curitiba uns trezentos dias no ano, mais ou menos. Nos outros sessenta e cinco chove torrencialmente, o que dá no mesmo! Eu saía de casa de manhã como Emo e voltava ao meio-dia igual ao Valderrama.

Ainda bem que naquela época eu não fazia idéia de quem era Janis Joplin e também não existia internet. Quando vi uma foto dela pela primeira vez já era mais velha, tinha domado os cabelos e pude somente compreender perfeitamente porque ela morreu de overdose. Tem coisas que nem bebendo dá pra esquecer...

Como as toucas não davam jeito, sucumbi à sugestão de uma cabeleireira para testar uma técnica chamada touca de gesso que consistia em passar um produto no cabelo e escovar bem. Mais um perfumezinho de Belzebu que encarei pela frente. Fui ao salão cheia de esperanças e me entreguei às mãos profissionais que me deixariam igual à Perla.

Como tudo nessa vida tem um fim, a adolescência inclusive, embora eu não tenha ficado com o cabelo dos meus sonhos, dá pra dizer que tivemos uma certa trégua dos vinte aos trinta anos. Dez anos de relativa paz nos quais minha maior preocupação eram os fiozinhos brancos que começaram a aparecer.
E então, sofri uma nova revolução hormonal causada pela gravidez! Quando o bebê está ali pelos quatro meses, o cabelo da mãe começa a cair desesperadamente. Juntando-se a isso o fato de que mais ou menos nessa época já não eram poucos os fios brancos, dá pra imaginar que pegamos em armas novamente e partimos para a luta, meu cabelo e eu.
Não acreditava mais em soluções caseiras, é claro. Não poderia contar, nem por alto, a quantidade de tratamentos que fiz. Cremes, extratos, ampolas, xampus, pílulas, médicos dermatologistas. Minha herança genética não me deixava qualquer esperança. E as escovas continuavam porque sem elas iam pensar que eu era uma reencarnação da Janis Joplin. Sem os óculos.

Com a segunda gravidez, aquilo que era ruim, ficou pior! E para complicar ainda mais a situação, morava fora do país sem dinheiro pra salão, creme ou tratamento. Tintura era eu mesma quem fazia, com resultados que iam do horrível ao tenebroso. Durante um ano cortei eu mesma meu cabelo porque a experiência em salão tinha sido traumática. Voltei para o Brasil num estado deplorável: além da segunda gravidez, um hipotireoidismo fez cair mais de um terço do meu cabelo, que já era quase um terço branco e, o que restou, continuou aquela coisa disforme, nem liso nem crespo.
Com a visita de uma amiga brasileira na minha casa na França aprendi várias coisas sobre silicone, cremes e tratamentos. Foi uma aula para lá de valiosa. De novo em terras verde-amarelas, e novamente submetida ao ventinho úmido de Curitiba, coloquei tudo em prática. Deu uma melhoradinha, mas ainda caía muito, não nascia o suficiente, eu estava insatisfeita. Vocês sabem, a gente vive reclamando, até descobrir que tudo pode ficar ainda pior...
Veio o diagnóstico de um câncer e, por causa das sessões de quimioterapia, fiquei careca. A verdade é que essa foi a época em que menos briguei com meus cabelos, simplesmente porque eles debandaram todos! A peruca foi uma experiência à parte, um causo a ser contado em outro dia.
Com o fim das quimios, meus cabelinhos começaram a voltar. Tivemos um reencontro festivo, cheio de saudades, cuidados e carinhos de ambas as partes. É verdade que, se antes eu tinha um terço deles brancos, agora é quase metade, mas tudo bem. Eles voltaram TODOS! Todos os que tinham caído durante toda a vida, o que significa que eu jamais me vi com tanto cabelo na cabeça!
Estou feliz com isso, é claro! Mas... Sempre tem um mas. Ah, o ser humano, esse eterno insatisfeito. Tal como haviam me prevenido e conforme eu sempre sonhei, agora tenho cabelos crespos! Não é ondulado não. É crespo mesmo. Tanto que tenho andado constantemente com a voz da Sandra de Sá na minha cabeça cantando Sarará crioulo.
Eu sei, isso foi tudo o que sempre quis, fiz permanente e coisa e tal. Mas a moda agora é chapinha e eu moro em Curitiba, que já foi a terra do topete e que hoje deve ter a maior concentração de profissionais de escova progressiva por metro quadrado do país! A considerar o que vejo nas cabeças das curitibanas, elas são todas descendentes de índias ou japonesas. Até as loiras.
Quando abandonei a peruca meu cabelo tinha pouco mais de meio centímetro de comprimento. Voltei a ser o Joãozinho dos meus onze anos. Quer dizer, uso umas echarpes para dar a impressão de que é um corte à la garçon. Fica mais chique.

Ouvi vários comentários de que ficou bom e cheguei a concordar. Mas disse que vou deixar crescer até eu ficar igual ao Capitão Caverna. Daí posso pensar em cortar curtinho de novo. A diferença é que nesse caso vai ser porque eu quis!
O problema é que com um centímetro de comprimento ele já começou a encaracolar. Olhava minha imagem refletida no espelho e me achava a cara do Ronaldinho, só que sem ter os mesmos milhões que ele no banco. Que injustiça!


Nesta manhã tive ummomento difícil... Ontem eu tinha usado a técnica da vez que consistia em fazer chapinha na parte da frente, no que seria a franja, e também nas laterais, deixando a parte de trás ao natural, ou seja, igual a um poodle ruivo, separando as duas metades com uma tiara. Até estava ficando legal, dava um certo ar romântico, mas o clima de Curitiba...

Tudo bem, estou exagerando, admito. Meu cabelo não está azul! Mas o resto era igualzinho! Recomecei a sessão: silicone, spray, creme, chapinha. Deu uma ajeitadinha, mas não muito, e tremo só de pensar no dia de amanhã, principalmente porque continua o calor úmido, seguido de temporal e garoa...
Marquei hora no salão para o fim da semana. Esse cabeleireiro eu conheço e confio. Fez o último corte antes da peruca e operou um verdadeiro milagre com os poucos fios que restavam. Estou botando a maior fé nos poderes mágicos dele. Qualquer coisa, como não sou Sansão e sei que minha força não está nos meus cabelos mesmo, encaro uma máquina dois!
terça-feira, 7 de outubro de 2008
Eu é que sei onde meu sapato aperta
O ritual é o mesmo, com poucas variações sobre o tema: olho a vitrine procurando entre os modelos disponíveis aquele que atende aos meus requisitos, depois peço ao vendedor para me trazer um ou dois pares para experimentar...
Tá, tudo bem! Confesso que com o passar dos anos estou ficando cada vez mais exigente, mais cheia de manias. É coisa da idade. Portanto, tenho os tais requisitos. O jargão profissional dos vendedores de calçados muito provavelmente chama meus requisitos de frescuras mas, como o dinheiro e os pés são meus, acho que tenho o direito de querer ou não alguma coisa, não é verdade? Voltemos ao ritual...
Olho os modelos disponíveis, escolho um ou dois e chamo um vendedor dizendo, por exemplo:
- Eu queria ver aquela sandália de couro marrom ali e também aquela outra, número 39, por favor.
Às vezes, eles chegam a confirmar:
- Aquela de salto alto?
- Isso!
- 39, né?
- Exato!
- Só um momentinho, por favor.
E é aí que a expectativa começa. Quanto mais minutos tiver esse momentinho, mais apreensiva eu fico. E o meu desânimo só se confirma se eu observar o vendedor voltando escondido atrás de uma pilha de oito ou nove caixas de sapato que ele tenta equilibrar. Quanto mais caixas ele traz, menor a chance de eu ter encontrado o que procurava. E o ritual continua:
- Exatamente aquelas duas não tem, mas eu trouxe estes aqui, olha!
E eu olho! No lugar de uma sandália de salto alto em couro marrom vejo uma sapatilha preta, uma sandália dourada e um scarpin vermelho de plástico! E, então, o grand finale:
- Ah! Não tinha o 39, tá? Então eu trouxe o 38...
Provavelmente quando eu agradeço e viro as costas desolada sem nem ao menos experimentar o que ele, tão gentilmente, trouxe, devo ser fuzilada com o olhar além de virar objeto da conversa de cafezinho com os colegas: Mulherzinha mais cheia de frescuras!
Requisitos, meu amigo vendedor, requisitos. Se estou procurando uma sandália de salto alto em couro marrom e se, depois de ver tudo o que tinha na vitrine, escolho um modelo, é porque não estou querendo sapato sem salto, nem sandália dourada, muito menos calçados de plástico e, por mais obsceno que seja uma mulher que calça 39, o que eu posso fazer se a combinação genética entre meus pais gerou um Sasquatch? Fique tranqüilo, sou uma ligeira encarnação do lendário Bigfoot, ou Monstro do Pé Grande, mas não como criancinhas nem avanço nas pessoas mostrando as garras, embora até tenha vontade às vezes! Meu número é 39 mesmo e meus pezinhos de Cinderela não entram no sapatinho 38, muito menos no 37 (Sim! Até 37 já veio na pilha de caixas nada a ver que o vendedor trouxe pra mim). Não deu certo com as irmãs da Gata Borralheira e também não dará certo comigo. Além disso, nunca fiz treinamento pra gueixa. É 39 mesmo, fazer o que? Pelo menos minha altura não me deixa ficar parecendo um L maiúsculo. Principalmente porque tenho senso de ridículo suficiente pra não comprar sapatos de bico fino.
Tenho certeza de que, neste exato momento, além de ter contra mim uma horda indignada de vendedores de calçados, também tenho uma galera de leitores pensando: mas que criatura mais mal-humorada! Pobre vendedor que só quis ser gentil. Custa ser um pouquinho mais simpática? E a esses eu respondo: Custa. Custa, sim!
Não diz o ditado popular que tempo é dinheiro? Pois bem. As lojas de calçados só recebem UM par de cada modelo no tamanho 39. Unzinho só! Já fiz essa pesquisa em várias delas e a resposta é invariavelmente a mesma: só existe UM PAR de sapatos número 39 de cada modelo, o qual raramente está disponível quando eu chego. E, se por um lado, o fato de descobrir que não sou a única pezuda da cidade me alivia, por outro, faz com que eu entre numa corrida maluca contra esse outro Sasquatch que quase sempre consegue chegar antes de mim nas lojas e que, ainda por cima, tem o mesmo gosto que eu! Então, a cada vez que preciso procurar um sapato, sei que vou ter de passar por dez lojas ou mais até encontrar um par que seja do modelo, cor, altura do salto, material, preço e também tamanho adequados. Portanto, aqueles minutos que fico sentadinha na loja esperando enquanto o vendedor, que nem me conhece, logo não sabe dos meus gostos, garimpa coisas que não têm nada a ver com o que eu pedi, é o tempo necessário para minha adversária passar à minha frente e zapt!, me deixar comendo poeira na estrada. Descalça!
A solução para o meu caso talvez fosse entrar para alguma ordem religiosa dessas que andam sem sapatos por aí, mas morro de frio nos pés. Além disso, minhas chances de ser santa já ficaram para trás. Perdi qualquer esperança de canonização, tudo por culpa dos vendedores de sapatos que me fazem cometer o pecado da ira sem parar!
A passagem do tempo e a experiência têm as suas vantagens. Depois de viver esse ritual inúmeras vezes aprendi a fazer o pedido nas lojas de sapatos da seguinte forma:
- Eu queria experimentar um igualzinho àquele ali, preto, número 39. Mas é exatamente aquele modelo, PRETO e TRINTA E NOVE, tá? Se não tiver AQUELE MODELO, PRETO E TRINTA E NOVE, não precisa trazer NADA, certo?
Com certeza ele me dá as costas revirando os olhos (Mulherzinha mais cheia de frescuras!). Ingrato! Evito que ele desça escadas carregando as dezenas de caixas que ele vai ter de guardar depois e eu é que sou a chata!
Hoje, esqueci de fazer isso. Entrei na loja e disse, simplesmente:
- Queria experimentar aquela sandália de tirinhas caramelo, número 39, por favor.
Depois de mais de cinco minutos esperando, vi a vendedora chegar com duas caixas. Na primeira tinha um sapato fechado, marrom café, listado, alternando faixas de couro e vinil (Por favor! Faço um apelo desesperado aos fabricantes de sapatos: existem mulheres neste país que NÃO SUPORTAM sapatos de vinil, acreditem!). Na segunda caixa tinha um tamanco plataforma, com salto quadrado, todo bordado com flores coloridas. Pelo menos era na cor caramelo.
Pode ser que meus requisitos é que estejam exagerados, não é mesmo? Entre uma sandália de tirinhas de salto fino e um tamanco florido de salto quadrado não existe tanta diferença assim, eu até posso aceitar isso... Mas depois, que nenhum vendedor venha reclamar adicional de insalubridade por causa do chulé mortal que vai exalar dos meus pés quando eu tirar o tamanco para experimentar a rasteirinha azul turquesa que ele trouxer no lugar do sapato social prateado que pedi para ver. Resistirei até mesmo à tentação de jogar o tamanco na cabeça dele! Prometo!
terça-feira, 23 de setembro de 2008
Rio, quinze graus?!
Vocês devem ter notado que esse blog ficou meio abandonado semana passada. O que aconteceu é que eu fui ao Rio de Janeiro por conta de compromissos profissionais. Cheia de diminutivos na cabeça, com essa musiquinha nos ouvidos, coloquei só regatinhas e camisetinhas na minha mala. Por via das dúvidas, levei uma jaquetinha. Pois foi essa jaquetinha que me impediu de congelar naquela cidade! Exatamente: passei quatro dias na cidade maravilhosa, morrendo de frio!
No dia em que cheguei, chuva. E frio! Pra ninguém dizer que estou mentindo, aí vai uma foto de um termômetro de rua:

QUINZE GRAUS!
Na verdade, acho que a culpa nem é da Fernanda Abreu. É bastante possível que chegue a fazer quarenta graus por lá. O negócio é essa questãozinha particular entre nós. Quem? São Pedro e esta que vos escreve. Pretensão da minha parte, talvez. Mas que tem alguém na galera do Altíssimo de marcação cerrada com a minha pessoa, isso tem!
Tudo bem, tudo bem! Já sei quem é o mais forte, quem manda no tempo, já aprendi, já aprendi! Será que dá pra mandar um solzinho logo de cara na próxima vez que eu for pra um lugar qualquer? Pensando bem, caso essa coisa de chuva na minha vida continue, posso até oferecer meus serviços de nuvem negra para os lugares que estiverem vivendo períodos de seca, não é? Em vez de me leva que eu vou, sonho meu, atrás da verde e rosa só não vai quem já morreu, chegarei cantando me leva que eu vou, toró meu, atrás da Juliana veio a nuvem que choveu.
A verdade é que São Pedro é um brincalhão. Faz chover nos lugares para os quais vou, mas depois dá uma risadinha, acaba se comovendo com meus apelos e manda sol. Dessa vez, foram dois dias nublados e dois com sol. Mas frios! Ouvi dizer que foram os dias mais frios do Rio nos últimos tempos. Ninguém merece!
Aproveitei a generosa hospitalidade de minha amiga Sheyla e, entre uma obrigação de trabalho e outra, fui conhecer um pouco dessa cidade improvável, cuja única palavra que pode ser usada como resumo é contraste. O velho e o novo. O pobre e o rico. O belo e o feio. A harmonia e a dissonância. A classe e a absoluta falta dela. Está tudo lá, lado a lado. É impressionante.
Não cheguei a me transformar numa muchacha de Copacabana, como cantou Chico Buarque, mas molhei meus pezinhos nas águas (geladas, diga-se de passagem) da princesinha do mar. Nem de longe passei perto de ser confundida com alguma garota de Ipanema porque meu corpo não tem nada de dourado (com toda essa chuva, como poderia?) e meu balançado... Bem, tem muita coisa que balança por aqui, mas duvido que daria qualquer poema. Também não tinha violão, por isso nem procurei qualquer cantinho, mas imaginei mil canções pra fazer feliz. Claro que fui ao Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara e, lá do alto, derramei meus olhos por aquelas paisagens todas. Vi o Rio de sol, de céu, de mar. Dá pra entender perfeitamente porque D. João VI relutou tanto em ir embora do Brasil.

Mesmo com chuva e frio, mesmo com as desconcertantes favelas encarapitadas nos morros, mesmo com o contraste brutal que escancara a diferença absurda entre pobres e ricos, realmente, não há como negar as canções, o Rio de Janeiro continua lindo!

segunda-feira, 1 de setembro de 2008
Êta ela!

Uma caixa cheia de coloridas linhas de bordar é, para mim, uma coisa que existe com certeza no paraíso. E, exatamente as linhas dessa foto, são para lá de especiais. Essa é a caixa de linhas de bordar à máquina da minha avó Jandyra.
Há poucos meses estive com essa caixa nas mãos e fiz várias fotos para poder ficar olhando pra elas quando estivesse me sentindo no inferno ou no purgatório.
Desde muito pequena eu via essas linhas, brincava com elas, ficava encantada principalmente com as matizadas, essas que têm duas ou mais cores e fazem esses retroses listadinhos. Ficava horas ao lado da máquina de costura, observando o sobe e desce dos pés dela apoiados no pedal, que fazia girar a roda, que movia a correia de couro presa à máquina, que fazia a agulha subir e descer enquanto ela movimentava o bastidor para frente e para trás criando, aos poucos, os trabalhos maravilhosos que temos espalhados pela família.
Se hoje eu simplesmente não consigo viver sem estar próxima de linhas, agulhas e tesoura como vocês podem ver aqui, certamente é porque meu DNA tem o gen que obriga as mãos a trabalharem constantemente para criar peças, tramas, objetos... Não nasci aranha por puro acaso. Ou talvez tenha sido aranha em outras vidas, quem sabe? A verdade é já mudei de profissão várias vezes, já fiz de tudo um pouco. A única coisa que permanece inalterada para mim, desde os 7 ou 8 anos de idade, é essa ligação com tecidos e linhas. Minhas duas avós, Rosa e Jandyra, passaram elas também suas vidas enroladas aos fios, tecendo teias de bordados e rendas. Além de neta, no caso da minha avó Jandyra, ainda sou afilhada. Não tinha mesmo como escapar!
Jandyra, como vocês podem ver, é a imagem da avó típica: óculos, cabelos branquinhos, quitutes na cozinha e aquela ligação direta com o povo lá de cima. Terço constantemente na mão, é a ela que sempre recorremos nos momentos de necessidade: Vovó, tenho uma prova super difícil amanhã. Faz uma oração aí, por favor! Tráfico de influência, eu sei. Mas é que a reza dela sempre foi poderosa. Entrevista de emprego, cirurgia, dor de cotovelo, parto... Nada deixou de sair da melhor forma quando ela intercedeu por nós.
Só que o molde de vovozinha das histórias infantis termina por aí! Muito além da Jandyra que a gente vê na foto, tem a alegria, força e vitalidade que explodem onde ela estiver!
Não tem como ignorar sua sonora gargalhada, sem medo de mostrar que está feliz! Ela jamais deixou de expressar por inteiro as emoções, seja de alegria, seja de tristeza, seja de raiva ou de irritação. Nunca me esqueço de uma vez, eu devia ter uns 12 ou 13 anos, quando ela ficou na nossa casa tomando conta dos netos durante uma viagem dos meus pais. Nem sei o que é que eu e meus irmãos estávamos aprontando, só me lembro dela empurrando para longe uma mesinha de centro com o pé e gritando: MERDA!
Isso aí! A vovozinha de cabelos branquinhos sabia muito bem se fazer ouvir quando precisava! Só que a grande verdade é que são raríssimos os momentos como esses que eu tenho guardados na memória. Quando penso nessa minha avó, o que me vem à cabeça são imagens de risos, dança, festa e alegria. E não dá pra dizer que ela nunca tenha tido motivos para reclamar. Teve sim, e muitos!
Aos 11 anos, mais velha de cinco irmãos, perdeu a mãe que tinha apenas 28 anos. O pai dela, meu bisavô, era um homem ligadíssimo à beleza, trazia a si mesmo e aos filhos sempre bem arrumados de acordo com a vanguarda do mundo fashion, que devia chegar com décadas de atraso à pequena cidade do interior de Minas Gerais. Não importa! Minha avó Jandyra devia ser a própria imagem da melindrosa dos anos 20, com sainhas curtas e chapéus enterrados na cabeça.
Com a morte da mãe ela foi morar com tias que, escandalizadas com aquelas modernindades, costuraram tecidos quaisquer aos vestidos que ela teve de usar mesmo assim. O pai se casou de novo anos mais tarde e a madrasta tinha quase a idade dela. O relacionamento foi difícil, mas as duas se reconciliaram anos depois. Ela também se casou, teve filhos, e diante das dificuldades da vida no interior de Minas, viajou com o marido e a prole para começarem nova etapa no Paraná. Dito assim parece simples. Mas não consigo deixar de ficar impressionada e curiosa em imaginar como aconteceu essa viagem de mudança com nove filhos pela mão e a décima na barriga, de trem, por mais de mil e duzentos kilômetros de distância! A filha mais nova (minha mãe), tinha pouco mais de dois anos! Ela tinha toda a razão de repetir muitas vezes, deixando completamente a modéstia de lado: Êta eu!
A vida recomeçou no norte do Paraná e por ali seguiu. Com os dez filhos. Além desses, alguns abortos. Mas raramente ela comentou os filhos que não vingaram. Ao longo dos anos foi cada vez mais normal as pessoas se espantarem com a sua força e vitalidade. A resposta foi sempre a mesma: 10 filhos, 34 netos, 39 bisnetos e 3 tataranetos! Êta eu!
Não é que minha avó Jandyra não tivesse consciência das dificuldades pelas quais passou. Tinha. Mas ela, sem ignorar o lado feio da vida, sempre fez questão de focalizar o olhar no lado bonito dela. E essa concentração na visão do belo fez com que ela se sentisse sempre cheia de razões para ser feliz. O ruim existia, claro. Mas era solenemente ignorado.
Há mais de 20 anos um problema na coluna a obrigou a usar constantemente um colete ortopédico. Posso imaginar o quanto deve ser desconfortável um colete ortopédico. Mas o que ela fez foi aproveitar o colete para andar toda empertigada e ainda mais elegante. O colete impediu que ela curvasse os ombros e adotasse a atitude derrotada que eu vejo em tantas pessoas, às vezes bem mais novas do que ela.
Agora que parei para pensar no tempo do colete, vi que os números associados a essa minha avó são sempre grandes. Desde a numerosa descendência até os tempos de experiência...
No começo falei dos seus bordados à máquina, coisa que ela começou a aprender ali pelos 10 anos de idade. São mais de 80 anos de experiência já que ela completou 96 anos no ano passado. O colete ortopédico não deixava mais que ela ficasse sentada muitas horas seguidas. Em vez de reclamar, decidiu aprender crochê. Aprender uma coisa nova aos 70 anos de idade! E eu vejo tanta gente de 40 por aí dizendo que já cansou...
Recentemente descobri que sou um plâncton. Hoje penso que minha avó Jandyra sempre foi um plâncton. Só não se deu conta disso. A vida a foi guiando por caminhos diversos, nem sempre fáceis, e ela se deixou levar. Em cada novo destino encontrou seu bem-estar e continuou a descobrir razões para gargalhar e ser feliz. E, se por acaso alguma contrariedade pegava fundo, se a irritação viesse, sua reação era cantar. Não dizem por aí que quem canta seus males espanta? Quando começava a cantar a gente já sabia que ela estava espantando os seus males.
Eu me sinto um pouco pretensiosa em encontrar semelhanças entre nós duas, já que minha admiração por ela é imensa. Mas não consigo deixar de notar essas proximidades. Desde a mais bobinha delas, a coincidência nas iniciais e quantidade de letras dos nomes, Jandyra e Juliana, até o fato de sermos ambas librianas, apaixonadas pelo bordado e pela máquina de costura, enlouquecidas por flores e por um lindo pôr-do-sol.
Deve ser essa atração do libriano por tudo o que é bonito e harmônico. Nem sei quantas vezes ouvi minha avó comentar a respeito da sua própria roupa que Essa costurinha aqui da gola combina direitinho com a cor da minha meia, você viu? Também sou obcecada pela combinação de cores até mesmo nas peças que não se podem ver, se é que vocês me entendem, que sempre que possível vão combinar com a roupa que eu estiver usando. É mania, eu sei! Mas agora vocês sabem que é herança genética e que esse tipo de herança é incontrolável.
Quanto às flores, nunca consegui ter seu dedo verde... Adoro flores, não tem como passar por elas sem me sentir atraída, sem, no mínimo, olhar. Mas não consigo ter um vasinho sequer na minha casa. Já minha avó cercou suas casas de flores. Seus jardins sempre foram os mais floridos da rua e, até mesmo na hora de casar, ela conseguiu encontrar um marido cujo nome de batismo era a versão masculina do nome de uma flor: Accácio.
Claro que eles devem ter tido suas dificuldades como qualquer casal, é evidente que essa união foi como todas as outras, feita de concessões e ajustes de ambas as partes. Mas a imagem idealizada que eu tenho dos dois é a de uma união de corpo e alma, daquelas de filme da sessão da tarde, que fazem a gente dar um longo suspiro no final e dizer isso é coisa que só acontece no cinema...
Quando ele se foi, ela instalou rodinhas nos pés e passou a viajar constantemente, pulando da casa de um filho para a casa de outro. Provavelmente foi o jeito plâncton que ela encontrou de driblar a tristeza e de enganar a memória. Estando sempre fora de casa, ela podia criar a ilusão de que um dia voltaria para a sua própria casa e para o seu companheiro. Sábia Jandyra... Foram mais de 50 anos de vida em comum com aquele que o inconfundível sotaque mineirês transformou em Cassim.
Aliás, o tal do mineirês corre forte nas minhas veias. De tanto ouvir da minha avó frases como Tô pelejano nesse fugão pra fazê uma abobrinha afogadinha, tenho a sensação de que vivi nas Minas Gerais. É incrível isso, mas mesmo sendo paranaense, tenho saudade de Minas. Saudade do que não vivi, dos lugares onde não morei, das paisagens que não vi. Talvez seja por isso que eu faça tantas fotos. Procuro captar e fixar as imagens que tenho dentro de mim como uma forma de materializar minhas emoções. Uma tentativa de me traduzir em imagem. A chegada da máquina fotográfica digital permitiu que eu extravasasse meu interior sem medo e sem culpa, e nos últimos anos acumulei milhões de bytes em fotos.
Meus objetos mais freqüentes de cliques são, não por acaso, as flores, uma bela paisagem, um lindo pôr-do-sol, e o que eu chamo de texturas, cliques em close de cascas de árvore, pedras, areia, água... Uma vontade de captar o detalhe, a cor em estado puro, quem sabe, para com elas tecer um bordado de vida.
Como disse, as flores são minhas musas assim como um belo pôr-do-sol e, na grande maioria das vezes, era na minha avó que eu pensava quando via o resultado das fotos. Sei que não sou original nos meus temas fotográficos, mas não tenho qualquer pretensão profissional nessa área. Quero apenas refletir nelas o que carrego dentro de mim. E essa paixão pelo pôr-do-sol e suas cores mutantes é igualmente herdada da minha avó.
Um dia assistíamos as duas a um poente maravilhoso que era possível observar da janela do apartamento em que eu morava nos meus já longínquos 17 anos. Hoje uma cortina de prédios se interpõe entre meus olhos e o sol mas, naquela época, do oitavo andar tínhamos garantidos espetáculos quase diários. Naquele dia eu e minha avó olhávamos mudas para o sol que se escondia no horizonte, invejando secretamente a capacidade da natureza de brincar com as cores daquela maneira desconcertante. Num determinado momento, sem desviar os olhos do céu em brasa, ela me disse: Depois que eu morrer, quando você assistir a um pôr-do-sol desses, lembre de mim.
Eu olhei para ela querendo esboçar um protesto porque para mim ela era imortal. Mas não disse nada. Segui meus dias e meses assistindo a tantos outros ocasos e, nos últimos anos, fotografando todos os que consegui. Na última semana tivemos dias lindos em Curitiba, mas infelizmente a correria em que vivo não me deu a chance de ver nenhum pôr-do-sol. O que eu desconfio, é que eles devem estar muito mais bonitos, já que minha avó Jandyra, há sete dias tomou um grande embalo nas rodinhas sob seus pés e fez mais uma viagem, a última aqui dessa nossa Terra. O céu certamente está muito mais bonito e decorado. Provavelmente, logo estará também cheio de toalhinhas bordadas, é certo!
Agora minha avó Jandyra já é também parte do meu arsenal de imagens. Uma imagem composta de tantas outras, de flores, de paisagens, de bordados, de cores e de poentes. A partir de agora, minha avó existirá dessa forma dentro de mim:
Mosaico criado com o programa AndreaMosaic 3.23 Beta (referência no fim do post)
Usei um programa de computador que transformou parte das minhas fotos particulares nesse mosaico. Quanto mais de longe a gente olha a imagem, melhor enxerga a foto original...
Quando ela fez 90 anos, muita gente da família escreveu uma pequena história sobre ela e essas histórias foram reunidas em um livro. Eu quis muito escrever alguma coisa também naquela época, mas não consegui. Por quê? Não sei... Acho que ainda me faltava muita compreensão da vida. Da minha própria e também da vida dela. Eu não estava pronta. Senti muito não ter contribuído com aquele livro que ela tão orgulhosamente mostrou a tanta gente.
Hoje, uma semana depois de ela ter ido embora, com sete anos de atraso, faço a minha homenagem e coloco em palavras a imensa admiração que tenho por ela e pela vida que ela viveu.
Quero, como ela, ser capaz de diminuir a importância dos maus momentos, para enaltecer os bons. Quero ter vontade de aprender coisas novas aos 70, 80, 90 anos. Quero dançar no baile de formatura dos meus netos até às seis horas da manhã como ela dançou no meu quando tinha 82 anos. Quero me olhar no espelho aos 94 anos e dizer Não sei, mas acho que estou começando a ficar um pouco enrugada... Quero fazer meus bordados e costuras enquanto meus olhos e minhas mãos suportarem.
Não... Contrariamente ao que eu pensava aos 17 anos, minha avó não era imortal. Não aqui na Terra. E, pensando bem, o doce Accacinho já devia estar morrendo de saudades da sua Jandyra. No meu mundo interno, povoado de imagens, eu tinha de criar uma também para esse momento. Mas para isso não tinha máquina fotográfica, nem programa de computador que desse jeito. Por isso, inspirada num desenho que vi num jornal quando morreu o cantor Gonzaguinha, criei agora minha própria cena, como eu acredito que ela aconteceu. É uma pena que eu não lembre o nome do artista que fez o desenho que inspirou o meu (nem mesmo a santa Internet conseguiu me ajudar dessa vez). Mas tudo bem. Minha imagem está criada, desenhada a mão mesmo, e deixo aqui como parte dessa homenagem.
Lá de onde eles estiverem, espero que consigam também ver o que desejei para os dois...

Versão para impressão
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A Internet é realmente uma coisa maravilhosa! O mosaico criado com a foto da minha avó só foi possível porque encontrei um excelente programa gratuito na Internet chamado Andrea Mosaic. Aqui vão os dados para quem quiser também utilizá-lo, ou conhecer os interessantes trabalhos que podem ser feitos:
AndreaMosaic Beta
Copyright (c) 1997-2008 Andrea Denzler
Version 3.23 Beta Tile Aspect Ratio 12:9
http://AndreaPlanet.com/andreamosaic
Para quem quiser baixar o mosaico e ver todos os pedacinhos individualmente, clique aqui.
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Caso esteja aparecendo uma mensagem de erro no momento de baixar os arquivos (fotos e texto), deixe para voltar ao site em outro momento. O Yahoo (local onde coloco os arquivos para download) tem um limite diário de acessos. Uma opção é clicar o link com o botão direito do mouse e selecionar a opção Salvar destino como.