terça-feira, 25 de maio de 2010

Olho por olho...

Temos de reconhecer: às vezes, os vizinhos não se dão muito bem. Estão aí judeus e palestinos que não me deixam mentir. É claro que a coisa não precisa chegar àquele extremo, mas tem situações em que não tem política da boa vizinhança que resolva!

Eu mesma já tive meus percalços com vizinhos chatos e cheguei ao ponto de ter de mudar de prédio pra evitar as reclamações de um ranzinza do andar de cima. Uma das minhas primas foi obrigada a vender o excelente apartamento que tinha comprado só pra se ver livre dos pitis histéricos de um morador que reclamava do barulho que eles faziam. Ela chegou a ensinar o filho adolescente a fazer xixi sentado porque o tal reclamava do barulho do xixi do menino, dá pra acreditar?

Há algum tempo fiquei conhecendo os tormentos de uma amiga, cujo vizinho tinha a casa em obras há oito anos, obras essas que já tinham provocado dois incêndios e um alagamento na casa dela. Depois de anos de brigas sem fim ela adotou a postura conhecida como os incomodados que se retirem, desistiu e comprou outro lugar para morar, mas teve de aguardar até que o novo local ficasse pronto, sempre convivendo com o canteiro de obras do gênero o inferno mora ao lado.

Quando alguém vive uma situação semelhante e tem de esperar até poder se mudar, o que fazer para sobreviver sem surtar até chegar o dia da libertação?

Eu concordo totalmente com o ditado que diz: se você não pode com ele, junte-se a ele. No caso da minha amiga ela tinha tentado todos os meios diplomáticos e legais. Nada resolveu. Numa situação dessas, para não viver só o lado ruim de uma convivência forçada, minha sugestão foi a de encontrar formas criativas de passar o tempo, no melhor estilo junte-se a ele.

Não sei em que pé está o imbroglio da minha amiga, mas caso você, dileto bleitor, esteja passando por situação semelhante, pode aproveitar as dicas que andei caraminholando. Aqui vai minha singela contribuição na forma de um Manual de Sobrevivência Para Quando Seu Vizinho Atormentar Sua Vida. São muitas as atitudes possíveis, vejam só...

Costure um monte de bonequinhos e espete agulhas e/ou pregos por todo corpo. Degole alguns, enforque outros, depois pendure todos eles dentro da sua própria casa, mas em um lugar que seja bem visível pelo sociável vizinho.

Faça uma maquiagem pálida, pinte olheiras, vista roupas pretas por um mês seguido, ouça somente música do compositor alemão Wagner (a Cavalgada das Valquírias é ótima!) e dê um jeito de, quando encontrá-lo, estar com um olhar perdido ou então esbugalhado. Se puder andar segurando um facão de açougueiro, melhor ainda!

Mude seus hábitos alimentares! Adote uma dieta que contenha, no café da manhã, um cozido preparado à base de músculo, bucho, rins, fígado, couve-flor, brócolis e repolho. Prepare o prato todos os dias sempre às 6h da manhã. O ideal é colocar a panela para cozinhar do lado de fora da sua casa na sacada ou área de serviço, um lugar qualquer que seja bem próximo da casa do seu amado vizinho.

Depois que fizer o cozido por vários dias seguidos, assim que cruzar com ele dê uma gargalhada súbita e então comece a falar o seguinte: Hã? O quê? Jack? É você, Jack? Cortar em quantos pedaços? No cozido? Sei... e lance ao seu vizinho um olhar de alto a baixo, cheio de significados.

É hora de abraçar de corpo e alma o sincretismo religioso! Programe encontros na sua casa, não se esquecendo de encerrá-los impreterivelmente às 22h. Nem um minuto antes, nem um minuto depois. A programação da semana poderia ser a seguinte: segunda-feira, umbanda. Terça-feira, um grupo carismático de carpideiras. Quarta-feira, aquele pessoal gente boa dos Hare Krishna. Quinta-feira, ensaio de grupo Gospel sertanejo. Sexta-feira será a noite do exorcismo ou das bruxas, quando sua casa abrirá as portas aos amigos e, vestidos de túnicas, vocês cantarão músicas em línguas estranhas e dançarão ao redor de um caldeirão. Não se esqueça de providenciar o indispensável equipamento de som bem potente.

Fique de olho na meteorologia. A cada vez que acontecer uma tempestade, bata portas e janelas, arraste correntes e arranje um CD de uivos e gemidos.

Falando em gemidos, muito provavelmente as coisas não estarão muito animadas na sua casa por causa das desgastantes brigas. Então, o negócio é improvisar! Alugue uns filmes pornôs e ligue bem alto na madrugada. Daí, bata a cadeira na parede divisória entre as casas no ritmo dos gemidos do filme. Portanto, Ah! Ah! Ah! Ahnnnnnnnn!!! serão acompanhados de Pum! Pum! Pum! Papapapapapa!!! De preferência, repita a operação a cada duas horas. No dia seguinte, quando encontrar seu vizinho, assim como quem não quer nada, exiba umas vinte caixas camisinhas e outras tantas de Viagra, dando um sorrisinho safado e dizendo: Hoje a coisa vai ser quente de verdade!

Aproveite para colocar em prática seu espírito solidário: ofereça-se para cuidar de bebês recém-nascidos que sofram de refluxo gástrico ou que estejam naquela fase das cólicas que fazem as crianças chorarem ininterruptamente por horas seguidas, principalmente na madrugada. Tenho certeza de que você facilmente dará conta de cinco crianças ou mais!

Esse será a hora perfeita para colocar em prática o plano tão acalentado, mas sempre adiado, de levar uma vida saudável! Portanto, dedique um tempo aos exercícios físicos. Providencie música de academia e contrate um personal trainer super animado que, equipado de um megafone, comande a sessão saúde com gritos de estímulo: Vamos lá! 1, 2, 3, 4! Força aí! Mais uma vez! 1, 2, 3, 4! Muito bom! Os exercícios serão praticados durante duas horas, sempre a partir das 8h da manhã em todos os sábados, domingos e feriados.

Deixe a música entrar na sua vida e também na do seu vizinho. Observe seus hábitos musicais e, generosamente, ouça aquilo que ele NÃO ouve, afinal, conhecer coisas novas é sempre bom. Escute suas músicas durante horas, se possível repetindo dez a quinze vezes seguidas a mesma canção. Pode ser pagode, techno, funk, música étnica, tipo chinesa, japonesa, indiana ou alemã, sertanejo, Kelly Key, Bonde do Tigrão ou, melhor ainda, uma seleção dos anos 70 composta de Jane e Herondy, Kátia, Márcio Greick, Nelson Ned e Odair José. Desde que seja das oito da manhã às vinte e duas horas sem parar, em repetições ininterruptas.

Compre uma telha de zinco e posicione-a embaixo de uma torneira que você deixará pingando durante toda a madrugada, numa área que se possa escutar da casa do seu amigável vizinho. Recolha toda a água em um balde e use para o cozido depois. Não dá pra desperdiçar água potável, não é mesmo?

Adote uma ou mais dessas medidas. Certamente não vai resolver de jeito nenhum o problema com o mala do seu vizinho, mas garanto que você vai se divertir demais! E é o povo quem diz que água mole em pedra dura... Pode ser que um dia você acabe ficando famoso por ter ido parar naquele quadro do Fantástico, O Conciliador. Todo mundo sabe que a esperança é a última que morre, não é? Depois, até mesmo, do seu vizinho!